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sexta-feira, 21 de agosto de 2015

Neste domingo, dia 16/08, realizamos a exibição dos "Retratos filmados" para a comunidade da região oeste, numa exibição profundamente marcante pros caminhos nossos. Postamos aqui um texto que Luis Henrique Mioto, um dos coordenadores, escreveu um dia após a exibição...

Foto: Exibição na Associação Ciranda da Cultura dos filmes "Retratos filmados" - fotos de Lis Sayuri


"No caminho, indo pra estreia dos “Retratos filmados” para a comunidade (no último domingo – dia 16 de agosto de 2015), andando pelas ruas da região oeste, vendo mãe gritar com as crianças, o rapaz caminhando cheioso de si indo pra biqueira, sons de uns pratos de bateria espatifados na igreja de um baterista desengonçado, as caras amarradas das senhoras moralistas sentadas, as crianças brincando correndo-tramando a mil, penso: “Só agora me toquei que uma exibição de filmes poéticos em meio a tanta função e desinteresse por algo assim está previamente fadado a grande chances de ser um fracasso.” 

Na real, desde que começamos a trazer cinema-poesia pra região há uns três anos atrás nunca conseguimos (nós da Ahoramágica) uma exibição que nos deixasse inteiramente satisfeitos, ou exibíamos para poucas pessoas ou as pessoas iam saindo no meio ou a pipoca interessava mais que o filme, nunca por lá conseguimos articular um debate mais profundo sobre nossas vidas e o mundo disparados pela bomba-sensibilizadora do filme num cineclubismo, isso nunca ocorreu plenamente… sempre saíamos levemente mais brochados. Tínhamos a impressão mesmo que cinema-poesia ali não era lá uma grande demanda da comunidade. 
Já tinha me abandonado nessa diluição rala de minha tentativa-sonho, enfraquecido e amolecido estava o sonho. E ainda sinto muito assim ainda. 
Acontece que nesse dia de domingo me apercebi caminhando num território de imensas dificuldades para se chegar com uma expressão artística ou um experimento poético. Quase todas senhoras estão quase sempre preocupadas com assuntos igrejísticos, outras tantas estão amedrontadas pelo terrorismo da TV, muitos estão dopados da exaustão do trabalho, a quase todos a palavra “cinema” não significa nada tão importante que mereça sair do lugar comum do seu cotidiano. Devem pensar: “se quero ver um filme ligo meu aparelho de DVD e coloco aquele filmezinho que comprei na mercearia”, filmes sobre policial, sequestro de aviões, explosões de carros, mulheres perfeitamente modeladas em perigo, enlatados ampliando a domesticação moral e cultural, “ou ligo na Temperatura Máxima.” Muitos estão depressivos, outros tantos têm só aquele um dia na semana pra fazer as visitas afetivas e manutenções nos buracos da casa, outros tantos estão em cima de coisas mais corporais, em brinquedos que corre, pulando, fritados nos movimentos. Como alguém nisso tudo vai sentar pra ver um filme sobre “memória”, pra sentir “poesia”? Tem tudo pra dar errado uma exibição destas. 
Quantos problemas técnicos podem dar? Esquece-se uma extensão, pronto, não tem tomada, falta adaptador por que a tomada é só de dois risquinhos e o equipamento é de 3 pinos, o controle do DVD não tem pilha, as caixas de som estão ruim, queimou toda a pipoca. Tudo ali é difícil dar certo, mas eu estou indo, levo os filmes em uma caixa cheia. Tomo um café na casa da Jaque e passeamos pelos bairros convidando os depoentes (as estrelas do dia, os homenageados), poucos deles estão em condições de ir. 
O mais poeta de todos sumiu faz um mês, um outro tão querido já não levanta da cama mais, outra perdeu o neto assassinado e está apavorada, outro está no hospital, tudo muito dificultado pelos rumos difíceis de vida por lá. Dois ou três dizem que vão, outro desconfia da intenção e diz se der tempo irá… se o cinema poético não funcionar é o esperado por essas bandas. Uma exibição cineclubista nesses territórios é infinitamente diferente das exibições nos cinemas multiplex dos shoppings, completamente outras conexões, significado, público e tipo de realidade. Uma arte amena ali não atrai ninguém. Teria de ser algo muito forte pra rasgar tantas cercas e amortecimentos, e foi.
Mas, por um motivo bem específico: porque era um filme deles mesmos, eles é que estão no telão brilhoso e isso atrai, deixa-os curiosos, reconhecem todo o cenário e as personagens... e aí acaba entrando organicamente a possibilidade da vivência da poesia e do estranhamento. São territórios familiares, até um ponto, até o susto de se perceberem sentido a arte brincando como seus elementos familiares. O cinema recortando, recosturando, enfatizando ramos miúdos do cotidiano que agora cintilam com brilhos de poesia, o público pescado pela isca do “familiar” se desentope pra poesia bater lá num fundo desconhecido. Se abre o novo poético, brilha o arzinho cintilante de uma noite mágica. Apareceram as extensões, as tomadas tão diferentes se encaixaram, a pipoca sempre está uma delícia foi a Lidu quem estrourou e colocou dentro de 68 pacotinhos junto com as crianças Lidu estava aconchegada, duas pilhas aparecem de dentro da mochila da Lis, o bolo do Pedro cresceu e está uma delícia, Vanessa divulga o filme com um piá no megafone, amigos de fora da comunidade se achegam curiosos nos homenageando com suas presenças carinhosas, todos colaboram, não é um espetáculo pra se chegar e consumir, mas sim um grupo de seres humanos tecendo o palco juntos para vivenciarem coletivamente uma alegria, todos estamos querendo que isso viva e queremos viver isso juntos por isso todos alimentam e costuram a exibição que vai acontecer. A Ciranda está em começo de festa.
Já há um grande público caminhando pela Ciranda, muitos moradores do bairro estão ali conversando sobre suas vidas sentados nas cadeiras na grama, a tela é esticada subindo na árvore de copa quadriculada, a árvore tem pencas de crianças que vibram nos galhos como frutas risonhas, duas depoentes chegam para grande estreia das suas memórias, estão envergonhadas, curiosas, são as estrelas e se sentem brilhando, alegres riem… os depoentes que disseram que viriam não vieram os que não viriam estavam lá… distribuímos os DVDs a todos ali, explicamos uma introdução e play. E tudo ali se encantou, fui reassistindo os filmes e sentindo as pessoas presentes, a poesia era percebida por todos, ela entrava nas pessoas, desentupia risos, brilhos, lagriminhas, felicidades… a poesia do cotidiano delas mesmas eram-lhes apresentadas, reveladas como mágica, disparadas pelo recorte do cinema, da edição, do enquadramento dos detalhes sutis, o comum era estranhado e elevado ao estado de arte, lembranças despertadas, pessoas e territórios reconhecidos. Tinha eu a impressão que estava ajudando a promover algo importante para aquela comunidade, finalmente tudo se desenrolava numa noite mágica como aquela, depois de alguns anos de amolecimento do sonho tive a impressão que era naquele momento que a comunidade tinha entendido um pouco o que estávamos buscando fazer e não conseguíamos lhes explicar, tinha eu a impressão que finalmente arrumamos uma maneira clara de explicar o que queríamos estando por ali, tive a impressão que ali era um marco de começo para a entrada da arte do cinema naquela comunidade, tive impressão que as pessoas abririam-se pro cinema depois dessa noite e poderíamos chegar mais perto, um primeiro passo que foi dado no último dia do projeto. 
Aquele tipo de filme, aquele formato de cinema fazia muito sentido para aquela gente naquela noite mágica e a poesia cintilava não mais tão sorrateira naquele território, mas sim brevemente acolhida, brevemente aceita em sua leveza. 
E cada um foi-se embora com seu DVD, com seu pequeno envelope de alegria poética, seu pequenino tesouro e o sentimento um pouco mais sensibilizado. Uma sessão de cinema em forma de abraço. E as crianças estão ali, brincando por todos os lados."




quinta-feira, 13 de agosto de 2015

Neste domingo (dia 16) faremos uma exibição de estreia dos "Retratos filmados" junto a comunidade da região oeste. 

No dia entregaremos os DVDs contendo todos os episódios e abraçaremos os participantes e depoentes do projeto. Com pipoca e a criançada de lá.

Vai ser na sede da Associação Ciranda da Cultura (Rua Francisco Quessada, nº10 - Conjunto Avelino Vieira - Londrina-PR). Às 17 horas.

Podem compartilhar e chegar junto! Será um dia marcante

Pra chegar lá de ônibus e a linha 307 ou 314.

Agradecemos todos colaboradores!